domingo, 19 de abril de 2015

Ver a vida como ela pode ser

Eu não quero me esquecer dessa frase, dita no filme Cinderela, porque eu também vejo a vida como ela pode ser. O que pode ser, para mim: sair do cinema, na metrópole ao lado da minha amada cidade, cinema este dentro de shoppings que exalam perfumes bons, que impregnam a alma da gente de sensações delicadas, pegar o carro no estacionamento e dirigir por aquelas estradas maravilhosas, com belas vegetações ao redor, e chegar até a cidade da minha vida. Chegando nela, o carro vai se dirigir para o meu condomínio e fazer a curva para a minha casa. Eu o vejo chegar na minha garagem, agora, e parar. Então, eu pego a chave da minha casa, abro a porta e chego na minha sala. Olho pela bay window, cujo vidro transparente deixa entrever o meu pé de acerola, bem em frente a casa, enfeitando o jardim. Assim eu vou de encontro ao meu pé de acerola. Ele está perto de mim, ele me pertence, nesse momento. Meu marido está comigo e também participa da cena. A vida é muito boa, nesse instante. Nós vamos dormir, provavelmente transar, e no dia seguinte experimento o bem-estar de dar de encontro novamente com a bay window e o pé de acerola, completamente translúcido através do vidro transparente. Esta é a vida como pode ser: simples, muito simples, e perfeita. A perfeição é simples; ela está apenas em um pé de acerola, o meu pé de acerola. Eu não queria mais nada, apenas nunca mais me separar do meu pé de acerola e ter condições de mantê-lo na minha doce cidade. 

Meu marido tem condições de pagar por essa vida, mas não o faz. Seu coração é de pedra e não quer ver a minha dor ao sair de um cinema, na cidade do trabalho, que está a 1.600 km do meu pé de acerola. Ele prefere se desviar do meu olhar triste e dos meus olhos marejados. Ele prefere o meu salário. Eu nunca vou perdoá-lo por isso. Nunca! Nunca! Nunca! Eu só estou pedindo um pé de acerola. 

Deus, você pode me ajudar? Pai, você pode me dar o meu pé de acerola de volta? Pai, você está aí? Você pode me ouvir? Eu só queria o meu pé de acerola e a paz. Eu vou mesmo ter que esperar 08 anos por ele? Pai? Você pode me ouvir? Fala comigo, por favor! Por favor!

sábado, 18 de abril de 2015

O dia que mudou a minha vida

Se ainda não tive êxito em operar mudanças drásticas na minha vida, creio que hoje, dia 18 de abril de 2015, tive o combustível que estava faltando para isso. Aconteceu uma das piores coisas que poderiam acontecer, aquela que muito temia e que, no fundo, sabia que ia acontecer. Saí de minha amada cidade, meu paraíso, por causa de indiretas e humilhações que estava sofrendo por parte daquele que se diz meu companheiro, tudo porque eu não estava ganhando dinheiro naquele momento. Ano 2010/2011. Por que eu não estava ganhando dinheiro? Porque saí do Brasil para acompanhá-lo no exterior, devido ao trabalho dele. Para isso, pedi demissão da escola em que dava aula, uma escola renomada e com alto salário, na qual minha filha tinha uma bolsa de estudos integral pelo fato de eu ser a professora da escola. Então regressamos para o Brasil, após três anos e meio, e uma defesa de uma tese de doutorado e, claro, volto desempregada, após os 40 anos, e com dificuldade para me colocar novamente no mercado de trabalho. Gastamos dinheiro para reformar a casa em que morávamos. Então, comecei a ser humilhada. Dei o troco. Fiz um concurso público em uma cidade longínqua (foi o que apareceu), passei e vim embora. Foi fácil? De forma nenhuma. Comi o pão que o diabo amassou, sozinha, com um filha de 10 anos nas costas, enfrentando um trabalho novo, em uma universidade pública e toda a demanda que isso requer. Chorei, adoeci drasticamente, caindo em profunda depressão. O digníssimo alugou nossa casa em troca de dinheiro. Meu pai morreu, em 2013, minha mãe enlouqueceu um ano depois, em 2014. Teve um infarto, seguido de um AVC isquêmico e enlouqueceu. Essa situação foi tão dura, mas tão dura, eu sofri tanto, que faz mais de um ano que não posto nada por aqui. Eu nunca caí tanto como caí em 2014. 

Sinopse feita, - ainda vou falar muito de 2014 - hoje, exatamente hoje, meu marido, que continua na minha querida cidade, está nos visitando. Sim, ele nos visita. Os três anos e três meses que estou aqui, na cidade do trabalho, me envelheceram. Eu tenho sofrido muito. Hoje, na mesa do café da tarde, ele comenta uma foto que minha irmão postou no facebook. Minha irmã nunca trabalhou, vive do salário miserável do marido, que é bem mais velho que ela, mas é feliz. A empresa em que ele trabalhava, em São Paulo, foi transferida para outro estado e ela precisou fazer a mesma coisa que tive que fazer: pedir demissão do trabalho. Só que nunca mais trabalhou e isso faz anos. Mas ela é esperta, cuida muito dela e do filho: alimentação saudável, academia, e, sem o estresse que passo, conseguiu ficar bem jovem. Aos 44 anos não tem um fio de cabelo branco. Faz tratamentos de beleza no salão do bairro, tem um corpo perfeito e está muito bem, e eu feliz por ela. Ingenuamente, ela posta uma foto de biquini, no facebook, para mostrar que viajou e que estava feliz. O marido comenta a foto, dizendo que ela estava muito bem e que eu TENHO ENVELHECIDO MUITO, O ROSTO ESTÁ FEIO, VELHO, QUE NÃO ME CUIDO E QUE A DIFERENÇA ENTRE MIM E MINHA IRMÃ ERA GRANDE. EU PAREÇO BEM MAIS VELHA. Desgraçado! Desgraçado! Desgraçado! Desgraçado! Eu me acabei sim, vivendo aqui sozinha, passando horas escrevendo artigos, trabalhando como uma louca, tomando conta da filha, da casa, do dinheiro e tentando garantir a aposentadoria da família, pois como funcionária pública tenho direito a uma boa renda. Meu salário é bom. Eu também já havia notado o quanto envelheci e isto muito me entristecia. Eu sabia que esses últimos três anos acabaram comigo, me envelheceram em quase 10 anos. Eu já tinha me olhado no espelho. Eu estava tentando fazer alguma coisa, mas estava difícil. As atribuições que ele joga em cima de mim: ser linda: corpo perfeito, rosto sempre jovem, cabelo esvoaçante, pernas sem uma única veia, enfim o arquétipo da mulher linda fisicamente; ser intelegentérrima; ganhar muito dinheiro, ou seja, ter um salário alto e guardar todo ele para o futuro e mesmo assim conseguir ficar estonteante; ser a melhor mãe do mundo: fazer com que C. seja a melhor aluna da sala, tire as melhores notas, seja linda, sempre bem-arrumada e com a agenda cheia; manter a casa sempre impecável, ter uma ótima empregada e sim, claro, sou eu que devo pagar por ela, ter sempre comidas ótimas, saladas, sobremesas etc.; Ah! Comidas saudáveis. Ele acha que tenho que comer sopinha e salada à noite, porque não temos mais idade de jantar; nada de juntar vários carboidratos. E por aí vai. A lista de perfeição é enorme. 

Eu não quero envelhecer ao lado de um homem desses. Eu não mereço isso. Quando eu tiver 65 anos, se chegar lá, ele não vai nem olhar para mim. Eu não posso evitar o passar dos anos e o envelhecimento das células. Ninguém até hoje conseguiu, mas, na concepção dele, eu tenho que conseguir. 

Hoje eu estou retirando a aliança do dedo. Fiquei 13 anos com ela, sem tirar para nada. Antes dela, moramos 06 anos juntos. Ao todo, 19 anos. 

Eu peso 57 quilos, embora o tempo e a vida tenham judiado de mim, nesses últimos 03 anos, pareço ter bem menos que meus 46 anos, ganho muitíssimo bem, tenho um emprego público, portanto não o perco, moro em uma belíssima casa, cara, ao lado do meu trabalho, tenho bom carro, sou inteligente e por aí vai. Acho que vou encontrar um bom companheiro, não vou? Meu único mal é sofrer de depressão, mas tenho cuidado dela, desde que minha casa foi alugada. Acho que não é minha casa. Aquela era uma vida utópica, que não me pertencia. Como ele sempre fez questão de jogar na minha cara, de maneira indireta, não fui eu quem pagou por aquilo. Eu não tenho como pagar aquele paraíso. 

Que pena!